domingo, 10 de outubro de 2010

Uma Restauração de Fé - Parte 3/4

    Parei, hesitante.
    "O que?" murmurou a garota.
    "Polícia. Talvez eu deva te entregar."
    Senti sua indifenreça esgotada. "Eles só vão me levar pra casa. Não me importo." Ela me abraçou de novo.
    Engoli a seco. Os Astors eram a elite de Chicago. Eles tinham contatos suficientes ao redor da cidade para pôr de lado por um bom tempo um pretenso investigador particular. E eles poderiam contratar os melhores advogados.
    É um mundo ruim, Dresden, a calma voz me falava. E os bons caras não vencem a não ser que possam pagar por um advogado caro, também. Você estará na prisão antes que possa piscar.
    Minha boca se distorceu em um sorriso amargo conforme um dos policiais uniformizados, uma mulher, me viu e franziu a testa em minha direção. Me virei e comecei a ir para o outro lado.
    "Hei," a policial disse. Continuei andando. "Hei!" disse ela de novo, e ouvi passos velozes na calçada.
    Corri para os escuro, e entrei no primeiro beco. As sombras atrás de uma pilha de caixas criavam o refúgio ideal, e levei a garota comigo. Me agachei lá, na escuridão, e esperei, enquanto os passos da policial se aproximavam e então se foram.
    Esperei no escuro, e senti todo o peso e escudirão se depositarem em minha pele, em minha carne. A garota apenas tremeu e deitou contra meu corpo, imóvel.
    "Só me deixa," disse ela, finalmente. "Vai pra ponte. Ele vai deixar você atravessar se eu não estiver com você."
    "Sim," eu disse.
    "Então vai. Vou aos policiais após você ter ido. Ou algo assim."
    Ela estava mentindo. Não tenho certeza de como eu podia afirmar isso, mas eu podia.
    Ela iria para a ponte.
    Fui ensinado que coragem é fazer o que você tem de fazer, mesmo que você esteja com medo. Mas algumas vezes eu me pergunto se coragem não é mais complicada do que isso. Algumas vezes, eu acho, a coragem te puxa para longe do chão mais uma vez. Fazendo um teatrinho de marionete, mesmo que você não queira. Talvez seja pura teimosia, sei lá.
    Não importa. Não para mim. Eu sou um mago. Não pertenço a este lugar mesmo. Nosso mundo não presta. Pode ser muito bom para os trolls e os vampiros e todas aquelas coisas horrendas que assombram nossos pesadelos (enquanto pressionamos nossos livros de física contra nossos peitos e reafirmamos para nós mesmo que eles não podem existir), mas não sou parte disso. Não quero ser parte disso.
    No escuro, tomei fôlego, e perguntei, "Qual seu nome?"
    Ela ficou em silêncio por um momento, e então disse, com uma voz muito insegura, "Faith."
    "Faith," eu disse. Ri, para que ela pudesse ouvir. "Meu nome é Harry Dresden."
    "Olá," ela disse, sussurrando.
    "Olá. Alguma vez já viu algo assim?" Cobri minha mão, invoquei um dos últimos resquícios do meu poder, e lancei uma quente e crescente luz para dentro do anel em minha mão direita. Isso iluminou o rosto de Faith, podia ver em suas macias bochechas os caminhos feitos pelas lágrimas que não ouvi cairem.
    Ela balançou a cabeça.
    "Aqui," eu disse, e tirei o anel de meu dedo. Então o deslizei para ela, para seu dedão direito, aonde o anel ficava menos solto. A luz morreu conforme eu fiz isso, nos deixando no escuro de novo. "Deixa eu te mostrar algo."
    "A bateria acabou," ela murmurou. "Não tenho dinheiro para outra."
    "Faith? Você se lembra do melhor dia de sua vida?"
    Ela ficou quieta por um minuto. E então disse, sua voz era pouco mais que um sussurro, "Sim. Um Natal. Quando vovó ainda era viva. Vovó era boa comigo."
    "Me fale sobre isso," pedi, em voz baixa, cobrindo a mão dela com a minha.
    Senti ela dar de ombros. "Vovó veio na véspera do Natal. Nós jogamos jogos. Ela brincou comigo. E ficamos no chão, perto da árvore de Natal, esperando por Papai Noel. Ela me deixou abrir só um presente, para a véspera do Natal. Era o que ela havia me dado."
    Faith deu um suspiro cansado. "Era uma boneca. Um bebê boneca. Mamãe e Papai me deram as coisas da Barbie, a linha toda daquele ano. Eles disseram que se eu deixasse todas elas nas caixas originais elas valeriam muito dinheiro mais tarde. Mas vovó entendeu o que eu queria de verdade."
    Então eu ouvi, o pequeno sorriso em sua voz. "Vovó se importava comigo."
    Retirei minha mão, e uma luz suave e rosada fluía para fora do anel ao redor de seu dedão, um gentil e amável calor. Ouvi Faith fazer um som de surpresa, e então, um sorriso de felicidade se abriu sobre sua boca.
    "Mas como?" ela sussurrou.
    Lhe dei um sorriso. "Mágica," eu disse. "Do melhor tipo. Uma pequena luz no escuro."
    Ela levantou sua cabeça em minha direção, estudando meu rosto, meus olhos. Fiquei envergonhado com o que ela podia perceber com aquele olhar. "Preciso voltar, não é?" ela perguntou.
    Retirei um pouco de cabelo caído sobre sua testa. "Existem pessoas que te amam, Faith. Ou que um dia amarão. Mesmo que você não possa as ver ao seu lado, aqui mesmo, agora mesmo, elas estão lá fora. Mas se você deixar a escuridão entrar em seus olhos, você pode nunca encontrar essas pessoas. Então é mehor levar um pouco de luz com você, pelo caminho. Você acha que pode se lembrar disso?"
    Ela concordou com a cabeça, seu rosto iluminado pela luz do anel.
    "Toda vez que ficar muito escuro, pense nas coisas boas que você tem, os momentos bons que você teve. Isso vai lhe ajudar. Prometo."
    Ela se inclinou em minha direção e me deu um simples, abraço de confiança. Senti minhas bochechas ficarem couradas quando ela fez isso. Ah, que seja.
    "Temos de ir," falei para ela. "Temos de cruzar a ponte e encontrar meu amigo Nick."
    Ela mordeu os lábios, sua expressão se tornou imediatamente preocupada. "Mas o troll..."
    Eu pisquei. "Deixa ele comigo."

Continua!

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